terça-feira, 26 de abril de 2016

Meu nome é recomeço...


“Tudo que começa, um dia acaba. Nenhuma história é eterna, a eternidade é uma sucessão de histórias dentro das existências. Precisamos aprender que iremos contar eternamente apenas conosco, que iremos passar na vida de muitas pessoas e muitas pessoas irão passar na nossa. Porém ninguém nos pertence, nem nós pertencemos a ninguém”.

Escrevi isso há mais de dez anos, mas naquele momento não imaginava que a vida fosse me provar essas verdades na prática e da forma mais dura possível. Naquela época, coloquei essas palavras no papel como se fossem regras apenas para os outros. Simplesmente, reproduzi com minhas palavras aquilo que já tinha lido e ouvido em outros lugares, querendo mostrar para os outros, mas sem imaginar que aquilo, era, principalmente, para mim. Eu tinha meu lar, minha esposa, meus pais, meus livros, meus gatos... Tudo estava perfeito e seria eterno, colossal engano. Nem imaginava que o que eu mesmo tinha escrito, era um lembrete, exclusivamente, para mim.

Naquele mesmo texto, eu, também, havia registrado, que “muitas vezes queremos acreditar em sonhos e fantasias, queremos crer que alguém nos completa, como se fôssemos incompletos, mas as leis da vida são claras, cada um é responsável pela própria evolução”. Aquelas verdades, pensava eu, eram para os ouvintes do meu programa de rádio, para os leitores dos meus textos. Eu!? Eu tinha ao meu lado, tudo que eu sempre sonhara. Uma pessoa que me completava em todos os sentidos, que havia transformado minha vida, dado sentido a minha existência, que me encorajava a transformar meus sonhos em realidade. Eu tinha alguém me completando, ia lá tomar para mim, aquela história de que “cada um é responsável pela própria evolução”.

Todavia o tempo vinha transformando tudo, pois a vida é lugar de aprendizado. Mesmo sem que eu percebesse, aos poucos, muitas coisas iam acontecendo. Por um lado, alguns sonhos tornavam-se realidade, eu me tornara professor; por outro, algumas mudanças duras iam acontecendo, meus pais partiam para outro plano de vida. Mas eu seguia firme, a vida me reaproximava do meu filho, eu tinha uma mulher de fibra ao meu lado. “Vida que segue”, “tudo está certo”, era o que eu dizia...

No texto em questão, eu dizia: “ficamos muitas vezes esperando que os outros façam por nós, e, até, cobramos que façam isso ou aquilo que é nossa responsabilidade”. Contudo, eu pensava que estava dizendo isso para meia dúzia de pessoas acomodadas. Certamente, nada daquilo tinha a ver comigo, imaginava inocentemente. Mas o tempo e a vida juntos, são perigosos, são professores duros. Juntos eles transformam tudo em um piscar de olhos. E sem me dar conta das lições que estavam por vir, fui vivendo, realizando outros sonhos... Tinha agora a estabilidade profissional, acreditando que não faltava mais nada. No entanto, sem saber nem “como”, nem  “por que”, de uma hora para outra, perdi a estabilidade do meu lar e fiquei sem minha companheira de todas as horas. Em uma fração de minutos, um verdadeiro furacão destruiu tudo que eu, contra minhas próprias palavras, acreditava “ser para sempre”. Talvez, essa tenha sido a experiência mais dolorosa da minha vida, porque esperava a morte dos meus pais idosos, mas jamais pensei que meu lar pudesse ser implodido da forma que foi... Sem que eu pudesse pelo menos entender o que estava acontecendo. Aprendi da forma mais dolorosa, na própria carne, o peso de minhas palavras... “Nenhuma história é eterna”.

Agora sim, estou aprendendo na prática, tudo aquilo que há mais de uma década, eu havia colocado no papel: “por mais longa que seja a caminhada, o primeiro passo é nosso e, na verdade, todos os passos terão que ser nossos”. Mas mesmo em farrapos, não parei, e não paro, a caminhada segue. A vida segue, e, eu vou seguindo junto. Pois, talvez, meu nome seja recomeço. Nasci só e sozinho continuarei meu percurso na certeza que “aproveitar as oportunidades significa desenvolver talentos e potenciais sem se escorar em ninguém. Simplesmente compreender a própria responsabilidade perante a existência”.   Sei que, talvez o “tempo”, nesta ou noutra vida, traga-me as repostas... Ou, simplesmente, não haja resposta, seja, apenas, a lei da vida: “tudo que começa um dia acaba”. Então chegou ao fim, ponto final!

Vou encerrar esse texto, como encerrei aquele, dizendo que a espiritualidade diz que "mais evolui quem melhor aproveita as oportunidades". A vida continua... A caminhada continua... Preciso aproveitar a oportunidade ímpar de estar vivo, de ter novas chances, nas formas de novos empregos, novas cidades. Conviver com novas pessoas, escrever novas histórias, viver um novo amor, sem a pretensão de que sejam para sempre. Dando continuidade à lei da vida que é progredir. "Nascer, morrer, renascer e progredir sempre. Essa é a lei".

  José Antonio Ferreira da Silva

segunda-feira, 11 de abril de 2016

Miopia Afetiva



“Será mesmo que só é possível identificar os problemas quando eles já não estão mais na nossa alçada?”

Em uma terça-feira de carnaval, já era madrugada, a folia já se acalmava, quando eu conversava com um amigo, que acabara de se separar. Ele assustado com a nova realidade, me contava que nunca havia sequer, pensado na possibilidade de voltar a ser solteiro. “Foram anos de um sonho”, dizia ele, que vivera um casamento estável e feliz, por mais de uma década. Os olhos marejados e o semblante abatido expressavam o seu sentimento de inconformismo e tristeza, diante do ocorrido.

O que me chamou atenção desde aquela conversa, foram os motivos que levaram à ruptura. Em momento algum, meu amigo falou sobre quebra de confiança, desrespeito ou, principalmente, ausência de sentimentos, que são os “motivos tradicionais” das separações. 

Ele resumiu, em apenas uma frase, o que levou a sua felicidade pelo ralo: “O desgaste da convivência”. Ouvindo isso, calei por um momento. Aquela justificativa me causava certa estranheza. Eu, simplesmente, não entendia como era possível, viver um relacionamento completamente feliz, por um longo período e, em seguida, esta mesma relação ser sustentada pela indiferença.

Continuamos o papo; e eu “montava um quebra-cabeça”, a partir daquela explicação, procurava entender o que levou uma relação tão estável a tamanho desgaste. Meu amigo, outra vez, resumiu. Agora, com uma frase extraída de uma belíssima canção da Marisa Monte: “Nós nos abandonamos!”, disse ele, retratando o peso da rotina, da indiferença e da falta de afeto no dia a dia.  

Tudo o que ouvi ali, imediatamente, me fez lembrar a música “Indiferença”, de José Augusto. Era a história do meu amigo, contada naquela letra: “Agora tudo isso está morrendo, o que era lindo, já não tem valor, você com essa sua indiferença, está matando aos poucos nosso amor.”.

Outro dia, li em algum lugar, que não é o amor que sustenta o relacionamento, mas é a forma de relacionar, que sustenta o amor. Eu concordo, aquela separação era uma prova disso. Não era sentimento que faltava ali, pelo menos não amor, talvez faltasse paixão. Curiosamente, percebi que a causa de tudo, confundia-se com a principal marca daquela relação, que até então, me parecia algo positivo, a estabilidade. 

O tempo de um relacionamento costuma trazer, além de confiança e maturidade, a falsa impressão de que o outro não é mais um “território a ser conquistado”, essa segurança excessiva, nos faz acomodar, nos leva para uma rua escura e perigosa, chamada “Zona de conforto”. A partir daí, é como se acionássemos um botão de “piloto automático”, onde sempre fazemos as mesmas coisas, os programas a dois e o diálogo, tornam-se incomuns, e aqueles momentos de ternura e cumplicidade, de cuidado e intimidade, são convertidos em lembranças.

Dentro da maldita zona de conforto, nós, quase nunca, conseguimos perceber quando as coisas vão esfriando e perdendo o gosto, sobretudo os homens. Mas por que essa imperícia? Por que remediar, quando podemos prevenir? Costumo dizer, que viver é como trocar um pneu, com o carro em movimento. Penso que seja da mesma forma com os relacionamentos, será mesmo que só é possível identificar os problemas quando eles já não estão mais na nossa alçada? Suponho que não. É muito mais inteligente consertar do que descartar ou substituir, principalmente, quando há sentimentos envolvidos. Deixemos nosso orgulho de lado e tratemos de reparar as nossas falhas, antes de apontar as falhas do outro. 

O orgulho, aliás, costuma ser o principal vilão do fracasso dos relacionamentos. Contê-lo, porém, não é tarefa fácil. Nós, inconscientemente ou não, jogamos a nossa felicidade para segundo plano em detrimento à nossa razão. Com isso, não conseguimos nada além do afastamento de quem nós amamos. Tornamo-nos solitários e, mais tarde, arrependidos, como retrata uma música antiga, que gosto muito, cantada pelo eterno Nelson Gonçalves: “Eu tive orgulho e tenho por castigo, a vida inteira pra me arrepender. Se eu soubesse, naquele dia o que sei agora, eu não seria esse ser que chora, eu não teria perdido você.”

Aquela conversa de fim de noite, me fez refletir sobre como nós “deixamos a vida nos levar”. Deixamos o tempo passar, não dizemos o que sentimos, não nos desculpamos, e não damos a devida atenção à todos os momentos em que a pessoa que nós amamos está ao nosso lado. É como se perdêssemos a capacidade de enxergar e reconhecer a importância daquela relação para nossa vida, no que eu chamo de miopia afetiva. Cabe a nós, um pouco mais de atenção, um “check-up” diário, de dentro para fora, para que possamos identificar e consertar as nossas falhas e, numa espécie de “manutenção preventiva”, preservar a saúde do relacionamento e do sentimento que nutrimos por quem já nos fez e, ainda faz, sentir vivos.


                               Allan Kemps Pontes Ferreira

terça-feira, 5 de abril de 2016

Poupança emocional


        Até pouco tempo, nós nos indignávamos com propaganda enganosa, fazíamos reclamações, falávamos mal da marca que nos enganou e, simplesmente, deixávamos de consumir. Hoje em dia, como quase tudo acaba virando piada na Rede, nos tornamos mais condescendentes com o que não corresponde às nossas expectativas. 

        No campo do Marketing, os especialistas em comportamento do consumidor, afirmam que a expectativa do consumo é muitas vezes mais importante do que o ato da compra, ou seja, tudo é projetado para gerar expectativa, esta, infelizmente, nem sempre se transforma em satisfação. Nós, de certa forma, aprendemos a lidar com isso, passamos a cobrar aquilo que nos foi prometido, quase que em forma de sátira, bem humorados, e com mais inteligência. 

        O nosso bom humor é maior do que a nossa insatisfação? Talvez não, mas a nossa maneira de tratar a “Expectativa x Realidade” de um sanduíche de fast food, é infinitamente mais madura e saudável do que quando tratamos de expectativas nos nossos relacionamentos.

        Certo dia, numa conversa de bar, um amigo me contava suas mágoas em relação àquela, que ele então julgava ser a mulher da sua vida, seu grande amor. E falava, sobre seu comportamento e suas atitudes, com um grande descontentamento. Naquele momento, ouvindo atentamente ele falar sobre seus planos e seus sonhos com a moça, percebi que o caso se tratava de uma desilusão, de expectativas não correspondidas. 

        Não se trata de algo inevitável, longe disso, mais ainda no auge de uma paixão. É comum, e quase natural, que a gente coloque um grande peso em todas as palavras e nos gestos de quem nós amamos. Tim Maia, em um de seus “hinos”, dizia que: “Em cima disso, a gente constrói os nossos sonhos, nossos castelos, cria um mundo de encanto onde tudo é belo”. E dentro desse “mundo de encanto” cantado por Tim, podemos nos sentir confortáveis, e, até mesmo seguros, mas tudo isso costuma durar pouco, “até a página três”.

        A segurança acaba e a confusão interna começa, quando a outra pessoa, naturalmente, não age conforme nós esperávamos, ainda que não haja maldade nisso, é sempre traumático quando somos surpreendidos com a realidade, e nos vemos retratados na bonita música que toca no rádio: “Me perdi no que era real, e no que eu inventei”.

        Percebo que nós temos uma grande dificuldade em “pisar firme” no presente, e em aproveitar aquilo que é, de fato, a única coisa certa que nós temos: o agora. Estamos habituados e, até mesmo viciados, em apenas utilizar o que nos acontece no presente, como uma espécie de insumo de produção dos nossos sonhos para o futuro. E isso funciona basicamente como uma sustentação para a nossa felicidade. O que nos faz alimentar os sonhos e “construir nas nuvens”?  Vejo isso como uma necessidade de guardar um pouco da nossa felicidade atual, para termos uma reserva, quando a coisa apertar, numa espécie de poupança emocional.   É como ter uma coluna forte e segura, que nos dá apoio nos momentos de turbulência.  

                           
                                  Allan Kemps Pontes Ferreira