terça-feira, 5 de abril de 2016

Poupança emocional


        Até pouco tempo, nós nos indignávamos com propaganda enganosa, fazíamos reclamações, falávamos mal da marca que nos enganou e, simplesmente, deixávamos de consumir. Hoje em dia, como quase tudo acaba virando piada na Rede, nos tornamos mais condescendentes com o que não corresponde às nossas expectativas. 

        No campo do Marketing, os especialistas em comportamento do consumidor, afirmam que a expectativa do consumo é muitas vezes mais importante do que o ato da compra, ou seja, tudo é projetado para gerar expectativa, esta, infelizmente, nem sempre se transforma em satisfação. Nós, de certa forma, aprendemos a lidar com isso, passamos a cobrar aquilo que nos foi prometido, quase que em forma de sátira, bem humorados, e com mais inteligência. 

        O nosso bom humor é maior do que a nossa insatisfação? Talvez não, mas a nossa maneira de tratar a “Expectativa x Realidade” de um sanduíche de fast food, é infinitamente mais madura e saudável do que quando tratamos de expectativas nos nossos relacionamentos.

        Certo dia, numa conversa de bar, um amigo me contava suas mágoas em relação àquela, que ele então julgava ser a mulher da sua vida, seu grande amor. E falava, sobre seu comportamento e suas atitudes, com um grande descontentamento. Naquele momento, ouvindo atentamente ele falar sobre seus planos e seus sonhos com a moça, percebi que o caso se tratava de uma desilusão, de expectativas não correspondidas. 

        Não se trata de algo inevitável, longe disso, mais ainda no auge de uma paixão. É comum, e quase natural, que a gente coloque um grande peso em todas as palavras e nos gestos de quem nós amamos. Tim Maia, em um de seus “hinos”, dizia que: “Em cima disso, a gente constrói os nossos sonhos, nossos castelos, cria um mundo de encanto onde tudo é belo”. E dentro desse “mundo de encanto” cantado por Tim, podemos nos sentir confortáveis, e, até mesmo seguros, mas tudo isso costuma durar pouco, “até a página três”.

        A segurança acaba e a confusão interna começa, quando a outra pessoa, naturalmente, não age conforme nós esperávamos, ainda que não haja maldade nisso, é sempre traumático quando somos surpreendidos com a realidade, e nos vemos retratados na bonita música que toca no rádio: “Me perdi no que era real, e no que eu inventei”.

        Percebo que nós temos uma grande dificuldade em “pisar firme” no presente, e em aproveitar aquilo que é, de fato, a única coisa certa que nós temos: o agora. Estamos habituados e, até mesmo viciados, em apenas utilizar o que nos acontece no presente, como uma espécie de insumo de produção dos nossos sonhos para o futuro. E isso funciona basicamente como uma sustentação para a nossa felicidade. O que nos faz alimentar os sonhos e “construir nas nuvens”?  Vejo isso como uma necessidade de guardar um pouco da nossa felicidade atual, para termos uma reserva, quando a coisa apertar, numa espécie de poupança emocional.   É como ter uma coluna forte e segura, que nos dá apoio nos momentos de turbulência.  

                           
                                  Allan Kemps Pontes Ferreira

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